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Internacional

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Livre, fundador do WikiLeaks volta aos EUA. Julian Assange enfrentava 175 anos de prisão

Assange declarou-se culpado de uma acusação de espionagem nos Estados Unidos em troca da sua liberdade. Ao fazer o acordo e admitir culpa, o jornalista colocou fim a um processo judicial que durou quase 15 anos


Num tribunal em Saipan, nas Ilhas Marianas, território norte-americano, o fundador do WikiLeaks declarou-se culpado de uma acusação federal de espionagem nos Estados Unidos em troca da sua liberdade.

O arquipélago no Pacífico fica relativamente perto da Austrália, país natal de Assange, e permitiu-lhe evitar entrar no território continental dos Estados Unidos.

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Jornalista australiano é perseguido pelas revelações publicadas no Wikileaks; iniciativa global quer lançar candidatura de Assange ao Prêmio Nobel da Paz – Divulgação/ABI

Assange esboçou um ligeiro sorriso quando a juíza Ramona Manglona leu a sentença, declarando-o um “homem livre”.

“Julian Assange enfrentava 175 anos de prisão por ter publicado provas de crimes de guerra, abusos dos direitos humanos e irregularidades cometidas pelos Estados Unidos em todo o mundo.”, sublinhou Jennifer Robinson, advogada de Julian Assange.

“Hoje, declarou-se culpado de um crime por ter publicado informações de interesse público, pelas quais ganhou prémios de jornalismo em todo o mundo e foi nomeado para o Prémio Nobel da Paz todos os anos na última década. Isto abre um precedente perigoso.”, acrescentou a advogada.

A lógica na libertação de Assange

O acordo, finalizado duas semanas antes de uma nova audiência perante a Justiça britânica sobre o recurso de Julian Assange contra sua extradição aos Estados Unidos, permite à promotoria evitar um procedimento incerto. Sobretudo, resolve definitivamente um caso que colocou em apuros três governos americanos sucessivos, acusados pelos apoiadores do WikiLeaks de serem inimigos da liberdade de imprensa.

“A administração Biden ficará feliz de encerrar esse caso”, escreve Jameel Jaffer, advogado especializado na defesa da liberdade de expressão na Universidade de Columbia, no site especializado justsecurity.org. “Foi a administração [do republicano Donald Trump, lembremos, que a apresentou a denúncia”, enquanto a do democrata Barack Obama renunciou a fazê-lo “devido às preocupações sobre as implicações para a liberdade de imprensa”, explicou.

Julian Assange evita os 175 anos de prisão aos quais poderia ser sentenciado no início, mas será condenado a 62 meses de prisão, pena que ele já cumpriu em Londres, por “conspiração para obter e divulgar informação relativa à defesa nacional”, a única acusação da qual se declarará culpado.

“A lógica do acordo é que Assange terá cumprido cinco anos de prisão por atividades que os jornalistas realizam todos os dias, e que precisamos absolutamente que eles realizem”, estima Jameel Jaffer, ao considerar o caso “um precedente terrível”.

Em sua carta à presidente do tribunal de Saipan, capital das Ilhas Marianas do Norte, Ramona Manglona, o Departamento de Justiça americano cita “a oposição do acusado a viajar para a parte continental dos Estados Unidos”.

Além disso, destaca a proximidade geográfica desta corte com o “país de nacionalidade do acusado, a Austrália”, para onde ele vai retornar após a audiência judicial.

A cronologia da saga do fundador do WikiLeaks na Justiça

Assange deixou uma prisão de segurança máxima em Londres, onde estava sob custódia desde 2019, após passar sete anos em autoexílio na Embaixada do Equador em Londres. Segundo o WikiLeaks, ele retornou a Austrália, seu país natal, na noite de segunda-feira. Confira abaixo a cronologia dos principais eventos desta longa saga legal.

Assange se declara culpado de uma acusação criminal em um acordo com o Departamento de Justiça dos EUA Foto: Kirsty Wigglesworth/AP

2006

Assange fundou o WikiLeaks na Austrália. O grupo começa a publicar documentos sensíveis ou sigilosos.

2010

Em uma série de postagens, o WikiLeaks divulga quase meio milhão de documentos relacionados às guerras dos EUA no Iraque e no Afeganistão.

Agosto de 2010

Promotores suecos emitem um mandado de prisão para Assange com base na alegação de estupro de uma mulher e na alegação de molestamento de outra. O mandado é retirado logo em seguida, com os promotores citando evidências insuficientes para a alegação de estupro. Assange nega as acusações.

Setembro de 2010

O diretor de processos da Suécia reabre a investigação de estupro. Assange deixa a Suécia e vai para o Reino Unido.

Novembro de 2010

A polícia sueca emite um mandado de prisão internacional para Assange.

Dezembro de 2010

Assange se rende à polícia em Londres e é detido aguardando uma audiência de extradição. O Tribunal Superior concede fiança a Assange.

Fevereiro de 2011

Um tribunal distrital no Reino Unido decide que Assange deve ser extraditado para a Suécia.

Assange discursa de dentro da Embaixada do Equador em agosto de 2012 Foto: Carl Court/AFP

Junho de 2012

Assange entra na Embaixada do Equador no centro de Londres, buscando asilo, após suas tentativas de apelar da decisão de extradição falharem. A polícia monta uma guarda 24 horas por dia para prendê-lo caso ele saia.

Agosto de 2012

Assange recebe asilo político do Equador.

Julho de 2014

Assange perde sua tentativa de cancelar um mandado de prisão emitido na Suécia contra ele. Um juiz em Estocolmo mantém o mandado alegando crimes sexuais contra duas mulheres.

Março de 2015

Promotores suecos pedem para questionar Assange na Embaixada do Equador.

Agosto de 2015

Promotores suecos arquivam investigações sobre algumas acusações contra Assange devido ao prazo de prescrição; uma investigação sobre uma acusação de estupro permanece ativa.

Outubro de 2015

A Polícia Metropolitana encerra a guarda 24 horas por dia fora da Embaixada do Equador, mas diz que prenderá Assange se ele sair, encerrando uma operação policial de três anos que estima-se ter custado milhões.

Assange na Embaixada do Equador, em fevereiro de 2016 Foto: Kirsty Wigglesworth/AP

Fevereiro de 2016

Assange alega “total vindicação” quando o Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre Detenção Arbitrária conclui que ele foi detido ilegalmente e recomenda que ele seja libertado imediatamente e indenizado. O Reino Unido chama a conclusão de “francamente ridícula”.

Setembro de 2018

O presidente do Equador diz que seu país e o Reino Unido estão trabalhando em uma solução legal para permitir que Assange deixe a embaixada.

Outubro de 2018

Assange busca uma liminar judicial pressionando o Equador a lhe fornecer direitos básicos que ele disse que o país concordou em conceder quando lhe concedeu asilo.

Novembro de 2018

Um processo judicial nos EUA que parece revelar inadvertidamente a existência de um caso criminal sob sigilo contra Assange é descoberto por um pesquisador. Nenhum detalhe é confirmado.

Abril de 2019

O presidente equatoriano, Lenín Moreno, culpa o WikiLeaks por recentes alegações de corrupção; o governo do Equador revoga o status de asilo de Assange. A polícia de Londres retira Assange da Embaixada do Equador e o prende por violar as condições de fiança em 2012, bem como em nome das autoridades dos EUA.

Maio de 2019

Assange é condenado a 50 semanas de prisão por violar a fiança em 2012.

Maio de 2019

O governo dos EUA indicia Assange em 18 acusações relacionadas à publicação de documentos confidenciais pelo WikiLeaks. Promotores dizem que ele conspirou com a analista de inteligência do Exército dos EUA, Chelsea Manning, para hackear um computador do Pentágono e liberar cabos diplomáticos secretos e arquivos militares sobre as guerras no Iraque e no Afeganistão.

Novembro de 2019

Promotor sueco arquiva investigação de estupro.

Assange em Londres, em janeiro de 2020 Foto: Henry Nicholls/REUTERS

Maio de 2020

Uma audiência de extradição para Assange é adiada durante a pandemia de COVID-19.

Junho de 2020

Os EUA apresentam uma nova acusação contra Assange, que segundo os promotores, destaca os esforços de Assange para obter e divulgar informações confidenciais.

Janeiro de 2021

Um juiz britânico decide que Assange não pode ser extraditado para os EUA porque é provável que ele se suicide se mantido sob condições severas de prisão nos EUA.

Julho de 2021

O Tribunal Superior concede ao governo dos EUA permissão para apelar da decisão do tribunal inferior que bloqueou a extradição de Assange.

Dezembro de 2021

O Tribunal Superior decide que as garantias dos EUA sobre a detenção de Assange são suficientes para garantir que ele será tratado humanamente.

Março de 2022

A Suprema Corte do Reino Unido se recusa a conceder a Assange permissão para apelar contra sua extradição.

Junho de 2022

O governo do Reino Unido ordena a extradição de Assange para os Estados Unidos. Assange apela.

Maio de 2023

O primeiro-ministro australiano Anthony Albanese diz que Assange deveria ser libertado e que “nada é servido” por sua contínua prisão.

Junho de 2023

Um juiz do Tribunal Superior decide que Assange não pode apelar contra sua extradição.

20 de fevereiro de 2024

Os advogados de Assange lançam uma última tentativa legal para impedir sua extradição no Tribunal Superior.

26 de março de 2024

Dois juízes do Tribunal Superior em Londres dão às autoridades dos EUA mais três semanas para apresentarem mais garantias, incluindo uma garantia de que Assange não receberá a pena de morte, antes de decidir se concederão a ele um novo recurso contra sua extradição.

20 de maio de 2024

Os dois juízes do Tribunal Superior decidem que Assange pode apresentar um novo recurso com base em argumentos sobre se ele receberá proteções de liberdade de expressão ou estará em desvantagem porque não é cidadão dos EUA. A data da audiência ainda não foi determinada.

24 de junho de 2024

O Departamento de Justiça dos EUA diz em uma carta apresentada ao tribunal que, sob um acordo com a agência, Assange será autorizado a ficar livre em troca de se declarar culpado de uma acusação sob a Lei de Espionagem por conspirar para obter e disseminar ilegalmente informações classificadas de defesa nacional.

Fonte/AP