O Brasil recentemente foi abalado por um esquema de fraudes envolvendo aposentados e pensionistas, que resultou em um desfalque estimado em R$ 6,3 bilhões, boa parte dos quais foi desviado diretamente de seus benefícios. Por meses, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) não adotou medidas eficazes para impedir os saques fraudulentos. No entanto, novos indícios apontam que o rombo é ainda maior, podendo ultrapassar os R$ 219 bilhões, devido à venda casada de serviços entre bancos, cooperativas de crédito e associações, principalmente no contexto de empréstimos consignados.
Além da cobrança indevida de mensalidades associativas, surge a possibilidade de que sindicatos e associações estivessem realizando descontos ilegais na folha de pagamento do INSS, sem a autorização dos beneficiários. O mecanismo seria implementado por meio de empréstimos consignados, feitos de forma fraudulenta com o uso de dados pessoais dos aposentados e pensionistas. As vítimas, em muitos casos, sequer sabiam da existência dos empréstimos, que eram formalizados sem seu consentimento explícito.
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Prática de Venda Casada
A suspeita que recai sobre essas entidades é a prática de venda casada, um crime financeiro que ocorre quando dois produtos ou serviços são oferecidos como um pacote, obrigando o consumidor a adquirir um serviço adicional para obter outro. Nesse caso, após obter os dados dos beneficiários, os fraudadores realizavam os empréstimos consignados, seguidos dos descontos das mensalidades associativas ou sindicais. Em alguns casos, o processo era feito na ordem inversa.
Para piorar a situação, os valores de empréstimos consignados podiam ser significativamente maiores do que as mensalidades cobradas. Dependendo da renda do aposentado e da margem consignável, um único empréstimo poderia ser 200 ou até 300 vezes superior ao valor da mensalidade associativa.

PF investiga liberação de consignados sem autorização de beneficiários do INSS e suposto elo entre entidades e empresas de créditos – Foto: Ana Gabriella Amorim
Crescimento Exponencial dos Empréstimos
O crescimento de empréstimos consignados ao longo dos últimos anos está diretamente relacionado ao aumento das mensalidades associativas. Em 2021, os repasses de empréstimos consignados para associações e sindicatos alcançaram R$ 57,4 bilhões. Em 2022, o valor subiu para R$ 72,5 bilhões, e em 2023, chegou a impressionantes R$ 89,4 bilhões. Somando os três anos, os empréstimos totalizam R$ 219,6 bilhões, um montante que desperta ainda mais desconfiança sobre a origem e a legalidade dessas transações.
Contudo, a situação pode ser ainda mais grave, já que a auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) não abordou os descontos realizados em 2024, e sua investigação foi limitada a uma análise superficial de sites de associações e sindicatos, que não apresentavam informações claras sobre os serviços de crédito consignado. Isso fez com que o TCU descartasse qualquer indício de venda casada, com base em uma análise empírica que se apoiava apenas em uma pesquisa superficial na internet. O fato de poucas entidades divulgarem publicamente os empréstimos consignados em seus sites não significa, no entanto, que essas práticas não estivessem ocorrendo nos bastidores.
Falha na Auditoria
O TCU, ao invés de investigar profundamente os contratos de empréstimos, limitou-se a consultar sites de associações e sindicatos, observando apenas três casos de oferta de crédito. De acordo com a conclusão do órgão, apenas essas três entidades mencionavam explicitamente o serviço de empréstimo, e duas delas o ofereciam como parte de um pacote de benefícios. A partir dessa abordagem, o TCU concluiu que não havia evidências suficientes para acusar essas associações de envolvimento em vendas casadas. Contudo, essa análise ignora a possibilidade de que as fraudes não estivessem sendo anunciadas de forma explícita e sim realizadas de maneira oculta.
A ausência de transparência nos sites das associações e o fato de muitos aposentados não estarem cientes dos empréstimos consignados abrem um precedente preocupante. Caso se confirme que as associações estavam, de fato, monetizando com a prática de venda casada, a responsabilidade sobre o empréstimo continuaria recaindo sobre os bancos ou cooperativas de crédito, que atuariam como credores, enquanto as associações se limitaram a simular o contrato fraudulento.
Impacto nos Aposentados
O pior de tudo é que essa fraude tem afetado diretamente aposentados e pensionistas, pessoas que, em sua grande maioria, vivem com recursos limitados e não têm condições de acompanhar de perto todas as transações relacionadas aos seus benefícios. Se confirmadas as acusações, milhões de brasileiros podem ter sido vítimas de uma série de crimes financeiros, que podem ter comprometido o seu sustento e prejudicado sua qualidade de vida de forma irreversível.
Embora o TCU tenha afirmado que não há dados suficientes para confirmar a existência de fraude, a falta de uma investigação mais aprofundada sobre o crescimento “casado” de mensalidades e empréstimos é um alerta para a necessidade de uma revisão rigorosa das práticas envolvendo o crédito consignado, especialmente para aposentados e pensionistas, que são os grupos mais vulneráveis nesse tipo de fraude.
Diante disso, é urgente que as autoridades responsáveis intensifiquem suas investigações e tomem medidas concretas para proteger os cidadãos mais vulneráveis, garantir a transparência nos processos e, acima de tudo, responsabilizar os envolvidos em práticas fraudulentas que comprometem a segurança financeira dos aposentados.
Nota: Este artigo tem como objetivo fornecer informações sobre os novos desenvolvimentos no caso de fraude envolvendo associações e sindicatos, sendo importante ressaltar que as investigações ainda estão em andamento e mais detalhes podem ser divulgados a qualquer instante.