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Saúde mental será a ‘grande causa nacional’ da França em 2025

O novo primeiro-ministro francês, Michel Barnier, apresentou nesta semana seu programa de governo. Entre vários anúncios, ele previu que a grande questão da França em 2025 será a saúde mental da população, afetada por sucessivas crises, entre elas, a pandemia de Covid-19.


Todos os anos, o governo francês anuncia uma questão considerada urgente no país. A escolha é feita desde 1977 por meio de um concurso público do qual do qual participam organizações e associações.

Para 2025, a saúde mental foi contemplada, o que permitirá, além do debate e da apresentação de novas medidas, a difusão de uma campanha de sensibilização pelas mídias públicas francesas.

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O anúncio de Barnier chega em um momento em que a questão da saúde mental é considerada uma emergência. Cerca de 13 milhões de franceses sofrem de doenças psicológicas ou psiquiátricas, o que representa uma em cada cinco pessoas no país.

Segundo Barnier, o foco será a prevenção e envolverá diversas instâncias: “o Estado, as administrações regionais, empresas e associações”. Para o primeiro-ministro, a saúde mental “é responsabilidade de todos”.

Pandemia afetou a saúde mental dos franceses

“Crises sucessivas e principalmente a da Covid-19” tiveram um impacto expressivo na saúde mental da população francesa, lembrou o primeiro-ministro. De fato, vários estudos e pesquisas relacionam a degradação do bem-estar na França como um efeito da crise sanitária.

A Agência Nacional de Saúde Pública, registrou um aumento de casos de depressão durante a pandemia. A faixa etária mais penalizada foi a dos 18 aos 24 anos, que sofreu um salto de mais de 20% em episódios depressivos.

Já uma pesquisa realizada na rede pública de hospitais de Paris e publicada no último 20 de setembro na revista científica Molecular Psychiatry associa casos graves de Covid-19, principalmente os que necessitaram de hospitalização, ao desenvolvimento de psiquiátricas. Cerca de 35 mil pacientes foram avaliados, entre os quais cerca de 10% foram vítimas de depressão e ansiedade após as internações.

No primeiro semestre deste ano, o instituto Ipsos também quantificou a importância da saúde mental na França. De acordo com a sondagem, 55% dos franceses pensa frequentemente na questão. Um quarto da população afirma ter se sentido deprimido durante várias semanas ao menos uma vez no ano, em 2023.

A pesquisa ainda mostra que a faixa etária dos 18 anos 24 anos é a que menos reage ao perceber um distúrbio mental, por não saber como agir ou a quem recorrer. Além disso, o balanço do Ispos mostra que as mulheres têm a tendência de considerar que não têm tempo para cuidar da saúde mental. Já os homens, em geral, são resistentes em buscar uma ajuda profissional por considerá-la inútil.

Gastos anuais de € 23 bilhões em saúde mental

A França gasta atualmente mais de € 23 bilhões anuais no atendimento e tratamento de doenças e distúrbios psicológicos e psiquiátricos, o que representa 14% das despesas totais na saúde. Por isso, para o primeiro-ministro, a estratégia da prevenção pode resultar em economias no futuro na diminuição da quantidade de consultas médicas, hospitalizações e reincidência.

As patologias psicológicas e psiquiátricas são o segundo motivo de atestados médicos atualmente nas empresas francesas. Já os afastamentos do trabalho de longa duração, superiores a um mês, estão em primeiro lugar, principalmente devido à depressão e ao burn out.

A urgência e a gravidade da questão da saúde mental na França leva profissionais do setor a expressar ceticismo sobre as promessas de Barnier. Para eles, o governo deve se concentrar em quatro pontos: o fim da estigmatização das doenças mentais, a prevenção, formação de outros setores da saúde para aliviar a pressão sobre psicólogos e psiquiatras e um maior recrutamento de profissionais especializados em saúde mental.

O Sindicato dos Psiquiatras de Hospitais da França afirma que 48% das vagas de profissionais especializados em saúde mental não estão ocupadas e que o setor está submerso. Ao mesmo tempo em que a quantidade de pacientes quase triplicou em pouco mais de 20 anos nos ambulatórios psiquiátricos da França, 88 mil leitos foram fechados. Nos hospitais públicos, médicos afirmam que se veem obrigados a triar pacientes para dar prioridade aos casos mais graves.

A preocupação com a saúde mental iniciou nos Jogos Olímpicos

Os atletas franceses na Olimpíada de Paris-2024 receberam a melhor proteção para sua saúde mental, com prioridade para conter o assédio online e o cyberbullying. A promessa foi feita e executada pela ministra do Esporte da França, Amélie Oudéa-Castéra, e pela secretária de estado de Assuntos Digitais, Marina Ferrari.

Amélie Oudéa-Castéra, ministra do Esporte da França -= Foto: Ludovic Marin/AFP

Ao longo das competições, elas discutiram maneiras de garantir que a saúde mental seja prioridade dos atletas da casa durante os Jogos Olímpicos, que foram disputados entre o dia 26 de julho e 11 de agosto, apresentando resultados e promovendo bem estar aos atletas.

Oudéa-Castéra afirmou que a ameaça do cyberbullying à saúde mental se amplia quando atletas de alto nível estão continuamente no centro das atenções, como aconteceu durante a Olimpíada. “Os atletas, assim como muitos dos nossos cidadãos, estavam expostos a esses riscos. Implementamos as ferramentas para ajudar nossos atletas, mas também nossos jovens e todos os franceses.”

Um estudo realizado pelo Instituto Nacional de Esporte, Especialização e Desempenho da França (INSEP) mostrou que 15% dos atletas apresentaram sinais de ansiedade elevada ou depressão, sendo que os primeiros sinais de dificuldades psicológicas começam, em média, aos 17 anos.

Os fatores de risco já eram bem conhecidos. Eles incluem estar longe da família por longos períodos de tempo, pressão dos torcedores, expectativas dos patrocinadores, reações de pessoas que perdem apostas, medo do fracasso e pressão constante para obter resultados. Esses fatores geralmente são ampliados pela exposição constante nas redes sociais.

Governo em busca de resultados

O governo, desde então, estabeleceu planos para proteger mais a saúde mental. A partir de junho, o site France.sport, dedicado aos atletas de alto nível, passou a ter uma seção chamada “Saúde Mental”, na qual os atletas puderam acessar um guia com conselhos práticos e um questionário de autoavaliação. Eles também tiveram acesso a um psicólogo recomendado pelo INSEP. Os mesmos serviços continuaram após os Jogos e também ficaram disponíveis para a comissão técnica.

O Ministro do Esporte trabalhou com outros ministérios para desenvolver e apoiar a profissão de coach mental, alguém que trabalha em estreita colaboração com os atletas para ajudar na sua preparação mental, a fim de melhorar o seu desempenho.

Entre outras medidas, na Vila Olímpica, no subúrbio de Saint-Denis, um oficial de salvaguarda da delegação olímpica e paralímpica francesa e três oficiais de assistência social (que são psicólogos treinados) estiveram no local durante os Jogos. Eles ofereceram assistência aos atletas e funcionários que estejam com dificuldades de saúde mental e, quando foi necessário, foram mobilizados para apoiar os atletas que estão hospedados fora da Vila principal.