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Internacional

Economia

“Comida lixo”: Senado da França rejeita acordo entre UE e Mercosul

Depois da Assembleia Nacional francesa na terça-feira (26), o Senado validou nesta quarta-feira (27) a posição do governo sobre o projeto de acordo de livre comércio entre a União Europeia e o Mercosul, que Paris rejeita "tal como está" em nome da defesa dos agricultores franceses. Senadores chamaram o acordo de concorrência desleal e disseram que não pode haver negócio entre “comida lixo e carros bonitos”.


A oposição ao tratado do Mercosul na sua versão negociada por Bruxelas foi aprovada quase por unanimidade no Senado, por 338 votos num total de 348 senadores, representando um raro tema de consenso da classe política francesa.

No dia anterior, os deputados também rejeitaram o tratado por ampla maioria, com a notável exceção do partido de esquerda radical A França Insubmissa (LFI), que exigia o abandono total do acordo.

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Para o ministro das Relações Exteriores francês, Jean-Noël Barrot, o voto das duas casas “é uma mensagem forte que será ouvida” por outros países europeus. “A dinâmica vai na nossa direção”, disse o ministro.

“A França não quer o fim dos acordos comerciais, nem o fim do comércio agrícola”, mas pede “sérias garantias para [os] agricultores”, que de outra forma seriam “confrontados com uma concorrência insuportável”, sublinhou a ministra da Agricultura, Annie Genevard.

Sessão da Assembleia Nacional da França nesta terça-feira (26). O acordo foi rejeitado em votação simbólica e não vinculativa – Foto: Tereza Suarez /EFE/EPA

Concorrência desleal e “comida lixo”

O líder dos senadores do partido de direita Republicanos (LR), Mathieu Darnaud, insistiu que se opõe a “um acordo que premia a concorrência desleal nos nossos mercados” e disse que é “inconcebível que este acordo entre em vigor contra a vontade da França”.

“Devemos continuar a negociar” para obter “reciprocidade das cláusulas essenciais” em questões de saúde e ambientais, disse o líder do pequeno grupo do governo no Senado, François Patriat.

Já o senador socialista Didier Marie pediu “uma moratória sobre todos os acordos comerciais atuais”, e a rejeição do Mercosul porque “não pode haver um negócio entre comida lixo e carros bonitos”, se referindo aos produtos sul-americanos e aos veículos europeus.

Diante de um “acordo dos dinossauros” em discussão há um quarto de século, “a oposição francesa será sem dúvida uma explosão democrática”, afirmou o ecologista Yannick Ja.

Lula diz que França ‘não decide’ em acordo UE-Mercosul

A França “não apita” no acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul porque é a Comissão Europeia quem “apita” em nome do bloco, afirmou, nesta quarta-feira (27), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

“Se os franceses não quiserem o acordo, eles não apitam mais nada, quem apita é a Comissão Europeia”, disse Lula durante um fórum sobre a indústria em Brasília.

A presidente da Comissão, Ursula von der Leyen, “tem procuração para fazer o acordo, e eu pretendo assinar esse acordo este ano ainda”, acrescentou.

Na terça-feira, os deputados franceses expressaram, com 484 votos a favor e apenas 70 contra, sua rejeição ao tratado comercial, alinhados com a posição do governo do presidente Emmanuel Macron.

O Executivo francês conseguiu, desta forma, o apoio do Parlamento para pressionar a Comissão Europeia nas negociações, em meio a protestos de agricultores, que temem uma concorrência desleal dos produtos sul-americanos, especialmente dos brasileiros.

As declarações de Lula ocorreram também após uma polêmica gerada no Brasil por uma carta publicada na semana passada pelo presidente do Carrefour, Alexandre Bompard, na qual afirmava que a rede de supermercados “não venderia carne do Mercosul na França.

O anúncio resultou no boicote e na suspensão, por fornecedores brasileiros, da entrega de carne para as lojas do grupo Carrefour no Brasil, país que representou 23% do faturamento do gigante francês no ano passado.

Na terça-feira, Bompard pediu desculpas em uma carta dirigida ao ministro brasileiro da Agricultura, Carlos Fávaro.

“Se a comunicação do Carrefour França gerou confusão e pode ter sido interpretada como um questionamento à nossa parceria com a agricultura brasileira e uma crítica a ela, pedimos desculpas”, escreveu Bompard, elogiando a “alta qualidade” da carne brasileira.

Os termos do pacto entre a União Europeia e quatro países do Mercosul (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai) foram acordados em 2019, mas vários países, incluindo França, Itália e Polônia, se opõem, sob pressão de seus setores agrícolas.

As discussões sobre os avanços das negociações estarão na mesa na próxima semana, durante uma cúpula do Mercosul em Montevidéu.

Com Agence France-Presse e RFI