
Brasileiros no Chile: estar em Santiago permite “bate-volta” para conhecer a neve – Foto: Fernanda Izidoro/Arquivo Pessoal
Os turistas brasileiros lembram com nostalgia da época em que viajavam para a Argentina e se sentiam como milionários. Até 2023, com a desvalorização da moeda local, uma diária de hotel custava cerca de R$ 150, e um jantar em um restaurante sofisticado e premiado não ultrapassasse esse mesmo valor. Hoje, com a valorização de 40% do peso argentino, o país se tornou um dos destinos mais caros do mundo. Por isso, agora os brasileiros estão indo para o Chile. A maior oferta de passagens para o país andino fez os preços caírem de 15% a 20% em um ano, tornando o local uma alternativa cada vez mais atraente.
Só em 2024, o número de brasileiros viajando para o Chile atingiu um recorde de 787 mil visitantes, segundo dados do governo chileno. Esse volume representa crescimento de 61,9% em relação a 2023, quando o total foi de 485,9 mil.
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Na Argentina, no entanto, a debandada foi geral. O número de visitantes de todas as nacionalidades caiu 18,5%, para 10,9 milhões de visitantes no ano passado. O Brasil continuou sendo o principal país emissor de turistas, com 20% do total. Mas a queda foi drástica: o total de visitantes brasileiros caiu de 632,1 mil em janeiro de 2024 para 134,8 mil no mesmo mês deste ano, ou seja, 78% a menos, conforme dados do Instituto Nacional de Estadística y Censos (Indec), da Argentina.
“Adoro a Argentina. Noivei lá. Queria muito ir novamente e apresentar Buenos Aires para as crianças, meus filhos. Mas do jeito que está nunca mais vou conseguir”, diz a especialista em logística aduaneira Fernanda Izidoro, de São Paulo.
Agora, Fernanda vai ao Chile esquiar, na estação de Chillán. Enquanto um pacote para Bariloche, na Argentina, custa hoje R$ 6,7 por uma semana, apenas com hotel e parte aérea, ela paga US$ 1 mil (cerca de R$ 5,8 mil) pela viagem de avião, hospedagem com jantar, café da manhã e os ingressos para esquiar inclusos. No ano passado, foi com um grupo de 88 pessoas da escola de seus filhos. Este ano, irá com o mesmo grupo. Mas há um detalhe: agora são 130 pessoas.
Passeando por Santiago
O publicitário Gabriel Borges também adorava a Argentina. O destino era uma viagem internacional curta e barata, que o ajudava a relaxar em feriados mais longos. “Cogitei ir no ano passado, mas as passagens estavam muito salgadas. Então resolvi ir para o Chile. Para Buenos Aires, iria pagar pelo menos 50% mais”, diz ele.
Nessa viagem, em dezembro de 2024, ele pagou R$ 1,5 mil pela passagem de São Paulo a Santiago. Um ano antes, ele lembra ter gastado, na mesma época, R$ 1,9 mil pelo mesmo trecho, numa viagem a trabalho. A queda de preço o animou tanto que Borges embarcou neste Carnaval novamente com a namorada para a capital chilena. “O Chile é agora a viagem internacional mais barata que existe. E Santiago é uma cidade bonita, segura e plana: é gostoso bater perna o dia todo porque tem muito verde, muitos parques”, diz ele.
Mais voos
Os preços aéreos caíram pelo aumento da oferta de voos nesse trecho. Só a companhia aérea Latam transportou mais de 2 milhões de passageiros nas rotas diretas ligando o Brasil ao Chile, um crescimento de 59% sobre o volume de 2023. O aumento na demanda fez a companhia aérea ampliar em 50% o número de voos entre os dois países na sua operação de janeiro e fevereiro de 2025, alcançando um total de quase 2,5 mil voos nesse intervalo.
Hoje, em média, um voo para a capital chilena custa 9% menos que nos últimos 12 meses, conforme levantamento do site de buscas Viajala.com.br. O preço médio da passagem de ida e volta caiu de R$ 1.539 para R$ 1.397, segundo o levantamento.
Parte cara
Mas nem tudo é barato no Chile. As hospedagens, em comparação com a Argentina, são, sim, menos custosas. Uma diária num hotel de quatro estrelas em Santiago sai a partir de R$ 294. Em Buenos Aires, não custa menos de R$ 340.
O problema é a comida. Embora os gastos com alimentação não cheguem nem perto dos preços de Buenos Aires, eles estão bem acima dos verificados no Brasil. Um hambúrguer Quarteirão com Queijo custa R$ 20 em qualquer McDonald’s de São Paulo. Em Buenos Aires, chega a R$ 41,66. Nas lanchonetes de Santiago, o valor é menor: R$ 30, mas ainda 50% mais caro que na capital paulista.
Nem mesmo isso afasta os brasileiros do Chile. Afinal, o destino concorrente, a Argentina, está bem mais caro. “Um lanche de rua, por exemplo, que custava 5 mil pesos em Buenos Aires há um ano e meio, hoje custa de 20 mil a 30 mil, ou seja, entre R$ 100 e R$ 150. É um padrão de preço dos países mais caros do mundo, como Suécia e Noruega”, diz Felipe Alarcón, diretor comercial do Viajala.
O site notou um aumento de buscas pelo Chile de 40% nos últimos 12 meses, em relação ao mesmo período anterior. A pesquisa foi feita por meio de um algoritmo que analisou quase 40 milhões de buscas de usuários do site em diferentes países da América Latina, incluindo o Brasil.
Neve mais perto
Mas quem vai ao Chile economiza de outros modos para compensar os gastos com alimentação. “Se você fica uma semana em Santiago, pode passar um dia na neve, sem precisar se hospedar em outra cidade. Faz um passeio bate-volta, de um dia para o Vale Nevado ou para Farellones”, explica Paula Rorato, diretora de produtos internacionais da CVC Turismo.
A empresa, uma das maiores do setor no Brasil, viu a demanda pelo Chile crescer 40% em 2024, enquanto para a Argentina houve queda de 20%. A CVC tem pacotes de quatro noites no Chile por R$ 2,2 mil por pessoa. Um semelhante para Buenos Aires não sai por menos de R$ 2,7 mil. “A situação do turismo na Argentina já está tão ruim que os hotéis começaram a dar desconto”, conta Paula.
Nem mesmo assim, com desconto nas diárias, a paulistana Fernanda não quer mais saber da Argentina. “Virei fã do Chile. Quero ir todo ano”, afirma.