Os portos brasileiros dedicados à movimentação de contêineres atravessam uma fase de esgotamento, um cenário de limitação de infraestrutura que se intensificou em 2024 e que tem causado prejuízos bilionários.
Ouvidos usuários, associações e órgãos do setor, foi reunido dados de movimentação dos maiores terminais de contêineres. As informações revelam um nível elevado de atrasos e cancelamentos de embarques devido a fatores como falta de estrutura portuária, além de fragilidades relacionadas aos operadores logísticos e modelos de gestão.
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Terminal de contêineres da Portonave, em Navegantes (SC), realizou um total de 452 embarques em 2024, dos quais somente 16 saíram no prazo previsto, segundo a consultoria Solve Shipping e CNI – Divulgação/Portonave
Em 2024, ocorreram 5.663 operações de embarque de contêineres nos portos brasileiros. Desse total, apenas 1.277 se deram dentro do prazo previsto, o que equivale a 23% das operações. A maior parte dos embarques – 3.219 operações – apresentou atraso.
Em parte, essa situação é resultado do descompasso entre o crescimento do transporte por contêineres e projetos para suportar essa demanda. De 2010 para cá, a movimentação nacional mais que dobrou, saltando de 6,8 milhões de toneladas naquele ano para mais de 13,9 milhões no ano passado.
O estrangulamento operacional está presente no dia a dia dos maiores terminais. No porto de Santos (SP), conforme o boletim Detention Zero, elaborado pelo Cecafé (Conselho dos Exportadores de Café do Brasil), 84% dos navios programados em 2024 sofreram algum atraso, resultando em uma média de 12 dias no ano. No porto do Rio, 56% dos navios descumpriram o cronograma, com 15 dias de atraso, em média. O Portonave, de Navegantes (SC), teve 56% de seus navios com atraso e uma média de cinco dias.
Além do desfalque na balança comercial, restou o prejuízo logístico para os produtores de café, com um custo extra de R$ 51,5 milhões para o setor, entre junho e dezembro de 2024. “Já chegamos a ter carga parada em porto por até três meses”, diz Heron.
O especialista em Infraestrutura da CNI, Ramon Cunha, diz que não se trata de uma realidade pontual da indústria do café, mas dos setores que dependem do contêiner para despachar seus produtos, como químicos, carnes congeladas, obras de madeira, açúcar e celulose.
“Em termos de volume, o que o Brasil exporta por contêiner equivale a cerca de 8% de tudo o que é vendido ao exterior, mas quando olhamos o valor agregado dessas cargas de contêineres, vemos que respondem por 40% das exportações brasileiras”, diz Cunha.

Empresários pedem ampliação do Porto de Santos por risco de esgotamento – Foto: Reprodução
“Isso é o que mais nos deixa preocupados”, diz Saulo Marquezini, gerente de relações governamentais do Grupo BMW no Brasil. “Essa coisa de pular o porto, porque a fila está grande, leva a atrasos graves. Já comprometeu planejamento de produção e até lançamento de carros no Brasil.”
Para usuários, trata-se de temas que precisam de aprimoramento em instrumentos de controle, fiscalização e transparência pelas instalações portuárias e empresas de navegação.
A movimentação recorde de contêineres em 2024, com aumento de 20% nestas operações sobre o ano anterior, chegando a 153,3 milhões de toneladas, ajudou a expor as limitações e fragilidades que restringem o segmento de ter um resultado ainda melhor.
No litoral paulista, o terminal Santos Brasil fechou dezembro operando com 76% de sua capacidade. O Brasil Terminal Portuário (BTP) ficou em 73%. Em Santa Catarina, o Portonave atingiu 78%, enquanto Itapoá atingiu 91%. No Paraná, o terminal de Paranaguá (PR) chegou a 81%. No Rio, o Multi-Rio atingiu 94% de sua capacidade.
Os problemas foram tema de reuniões recentes entre representantes de cada setor, a Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) e o MPor (Ministério de Portos e Aeroportos). Em linhas gerais, os usuários reconheceram os esforços para dar fim aos gargalos, mas cobram celeridade.

O governo pretende leiloar, no segundo semestre, a concessão do terminal Tecon S10, de Santos, que promete amenizar estrangulamento do setor nos próximos anos – Eduardo Knapp/Folhapress
“Vemos uma atuação positiva para acabar com esses problemas, mas precisamos acelerar as medidas, porque os volumes continuarão a crescer”, diz Mario Cezar de Aguiar, presidente da Fiesc (Federação das Indústrias de Santa Catarina), Estado que é o maior exportador de carne de frango do país.
Por meio de nota conjunta, o MPor e a Antaq afirmaram que está em andamento uma série de processos de leilões para áreas de contêineres, como o Tecon Santos 10. “O período de consulta pública para este leilão teve início nesta quinta-feira (20), e a expectativa é que ele aumente a capacidade do porto de Santos (SP) em 50%”, declararam.
Nesse primeiro momento, o objetivo é acelerar a autorização de TUPs (Terminais de Uso Privado) e, numa segunda etapa, diminuir o tempo dos arrendamentos de terminais portuários.